Das cinco artes nasceu Malala

Desde pequena Maria Laura Catão é apaixonada pela arte de atuar (FOTO: Gabriela Isaias)

O jeito como Maria Laura Catão fala entrega sua história. A pronúncia cantada, quase arrastada, deixa claro que ela veio do Nordeste. E a cor de manga rosa, toda verso, toda prosa, sugere que ela nasceu em Recife e é pernambucana cana caiana, como já diria Alceu Valença lá em 1989.

Malala, apelido dado pela família desde que ela era criança, deixou a faculdade de Arquitetura em 2013 para se dedicar à sua verdadeira paixão: o teatro. Saiu da casa dos pais aos 22 anos para estudar na Casa das Artes de Laranjeiras, no Rio de Janeiro, onde encontrou sua verdadeira liberdade artística e pessoal. Nesse bate-papo ela conta um pouco mais de sua história e fala sobre seus novos projetos.

Aquela Garota da Foto: Como você se deu conta de que queria ser atriz?
Maria Laura: Não sei de onde veio isso! Chega a ser estranho porque desde pequena eu dizia que queria ser atriz mesmo sem saber o que era direito. Meus pais sempre me incentivaram muito a ser livre e buscar as artes. Comecei a fazer balé clássico com quatro anos, a gente brincava de peça de teatro em casa… Acho que essa vontade foi surgindo daí. Tem uma história engraçada que a minha mãe vive contando sobre uma vez em que a gente estava brincando de teatro, quando eu tinha uns cinco ou seis anos. Eu era a Chapéuzinho Vermelho e ela era o Lobo Mau. Na hora em que ela me pegou eu comecei a chorar. Ela se assustou e disse “Filha, calma, isso é uma brincadeira!”. Então eu parei de chorar na mesma hora, olhei pra ela e disse “Eu sei, mainha! Tô brincando também!”. [Risos] Ou seja: eu sempre gostei de atuar!

Malala diz que, com sua profissão, aprendeu a ouvir e entender o outro ainda mais que antes (FOTOS: Gabriela Isaias)

AGF: E como foi a recepção na sua casa quando você decidiu cursar Artes Cênicas?
ML: Eu estava no meio da faculdade de Arquitetura. Só que, apesar de adorar estudar a história das construções, eu não gostava do curso e estava muito triste, estressada. A minha turma sempre viajava para conhecer a arquitetura de alguns lugares do mundo e surgiu uma viagem pra Barcelona que eu decidi ir. Como tenho uma prima que mora em Londres, depois da Espanha fui para a Inglaterra com a minha irmã para passar um mês a passeio por lá. Depois dos 30 dias a minha irmã teve que voltar, mas eu quis ficar mais tempo. Então decidi ficar em uma casa de estudantes, mas ninguém que falava português e eu quase não falava inglês! 

"Escrevi um e-mail para a minha mãe falando que iria trancar Arquitetura e prestar vestibular para Artes Cênicas"

AGF: Você teve que se virar!
ML: Sim! Sem a minha irmã por perto eu tive que me virar. [Risos] Só que isso foi muito importante pra mim. Tive acesso a outras pessoas, outra cultura, outras línguas, entre outras coisas. Nesse tempo aquela pressa e a necessidade que eu tinha de me formar logo foram passando. Comecei a pensar na minha vida e no quanto meus pais se esforçavam para que eu fosse feliz e fazer o que eu gostasse. Aí escrevi um e-mail para a minha mãe falando isso e dizendo que tinha decidido que iria trancar a faculdade de Arquitetura e, quando voltasse estudaria pra fazer vestibular para a CAL [Casa das Artes de Laranjeiras].

Entre seus artistas favoritos estão a atriz Penélope Cruz e o cineasta Pedro Almodóvar (FOTOS: Gabriela Isaias)

AGF: E por que você quis a CAL, especialmente?
ML: Porque eu sabia de muitos atores que eu admiro e que tinham se formado aqui. E é um curso diferente. Tem curso de teatro na Unirio, na UFRJ e em outras faculdades, mas a CAL tem tradição, são 30 anos só de teatro. Quis fazer principalmente quando eu descobri que tinha uma faculdade e não só curso técnico de Artes Cênicas.

AGF: Antes da faculdade você tinha feito algum curso de teatro na adolescência?
ML: Sim, sim. Fiz teatro com 11 anos, depois com 13. Cheguei a fazer algumas peças na escola e estudei um período do curso profissionalizante no Sesc de Recife, mas parei porque ficou difícil de conciliar com a Arquitetura, que demandava muito tempo. Foi depois que eu vim pro Rio.

"A arte faz você adquirir experiência de vida sem necessariamente vivê-la"

AGF: Quais foram os traços pessoais que você mudou depois que se aprofundou na arte de atuar? 
ML: Essa é uma pergunta difícil, hein? Acho que o observar, o compreender o outro. Eu vejo as coisas com muito mais clareza em relação a preconceitos, liberdades, sentimentos, aceitação do diferente. A arte faz isso, desfaz suas amarras, e acaba se tornando um estilo de vida. Você se torna mais livre porque sem a liberdade você não cria. E aprende, principalmente, sobre as questões humanas: você adquire uma experiência de vida sem necessariamente vivê-la, de fato. Quando você lê, vê filmes, interpreta e sente uma história acaba enriquecendo seu repertório.

Ela conta que adoraria fazer novelas, mas que seu foco é o cinema e o teatro (FOTO: Gabriela Isaias)

AGF: Existem alguns artistas que têm dificuldade em abandonar o personagem após a cena. Como é o seu processo de separação entre a personagem e a Maria Laura?
ML: Ontem nós até estávamos discutindo sobre isso na faculdade. Não existe um método pra se tornar ator. Método é cartesiano. E a arte não é cartesiana, é transcendente, quase abstrata. Então cada um reage de uma forma e tem a sua maneira de acessar seus personagens. Pode ser que, um dia, em um processo mais intenso, eu tenha alguma dificuldade em abandonar o personagem, mas até agora não passei por isso. Quando a peça termina eu vou saindo aos poucos daquela situação. Demoro um pouco não pro personagem ir embora, mas para aquele estado emocional em que eu estava passar.

"Para o ator se entregar ele precisa não ter medo e se doar por inteiro ao diretor"

AGF: Agora uma questão mais polêmica: na sua opinião até onde o diretor pode ir para imergir o ator no personagem?
ML: Como eu falei, não existe uma regra, sabe? O que existe é a relação ator-diretor, que deve ser de confiança e afinidade. Para o ator se entregar ele precisa não ter medo e se doar por inteiro ao diretor, que deve fornecer um suporte emocional pra te tirar daquela imersão em que você [ator] mergulha. É uma relação delicada e não acho que exista um limite. Existe um bom senso, mas vale à pena dependendo da proposta e do que é necessário ao personagem.

Uma das maiores saudades que Maria Laura tem do Recife é "o colo de mainha" (FOTOS: Gabriela Isaias)

AGF: Bem, das sete artes, você já fez arquitetura e atuação. Também escreve poesias e já fez dança. Então eu quero saber se você faz pintura, escultura ou toca algum instrumento.
ML: Bem, eu cursei um pouco de Arquitetura e agora estou me aventurando a escrever um curta metragem! Vamos ver como vai ficar! [Risos] Também gosto muito de escrever, fiz balé clássico dos quatro aos 18 anos. Cantar eu canto, mas muito mal! [Risos] Já fiz aulas desenho, mas não tenho muito talento pra pintura nem escultura. [Risos]

AGF: Você está escrevendo um curta! Pode falar sobre o que é?
ML: Ah, é segredo! [Risos] É segredo porque nem eu sei ainda como termina a história! [Risos] Mas é sobre amor. Pronto!

AGF: Agora uma pergunta mais divertida! Se a sua vida pudesse ser exatamente igual a de algum personagem de um livro, filme ou novela, quem você gostaria de ser?
ML: Nossa, não sei! [Risos] Nunca pensei nisso. Gosto muito das histórias de drama, mas não sei se gostaria de sofrer, não! Gosto do amor maravilhoso entre a Julieta e o Romeu, mas não queria viver uma tragédia dessa junto com o meu amado! 

Das sete artes, a atriz já se aventurou por cinco: Arquitetura, Pintura, Dança, Poesia e Cinema (FOTO: Gabriela Isaias)

"Nunca quis perder o meu sotaque porque faz parte de quem eu sou"

AGF: Você é de Recife (PE) e tem o sotaque bem forte. Isso já te atrapalhou em algum personagem ou você tenta manter por fazer parte da sua identidade?
ML: Quando cheguei no Rio eu era bem preocupada com isso porque muitos professores pegaram no meu pé sobre essa questão. Cheguei a fazer fonoaudiólogo, mas nunca quis perder o meu sotaque porque faz parte de quem eu sou. Então, quando eu preciso, suavizo o meu jeito de falar. Acho que isso de sotaque neutro é mais pra novela, já que no teatro não tenho tido muitos problemas, pelo menos por enquanto.

AGF: E você já pensou em fazer novela ou sempre quis teatro?
ML: Sim. Eu quero fazer novela, mas meu foco mesmo é teatro e cinema.

AGF: Agora eu quero que você imagine que vai ler essa sua entrevista daqui a dez anos. O que a Maria Laura de hoje diria para a Maria Laura daqui a 10 anos?
ML: “Você é mais forte do que parece ser”. Essa foi profunda, né? [Risos] Mas é isso aí.

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LIGEIRINHAS

O que te tira o sono? Ansiedade.
Um medo. Pássaros.
Uma frustração. Não saber cantar.
Uma saudade. Mainha.
Café ou Toddynho? Toddynho!
Um superpoder. Teletransporte!
Maternidade. Medo.
Um filme. A Pele Que Habito.
Foi golpe ou não foi golpe? FOI GOLPE.
Três perfis no Instagram. @streetartglobe, @flaclaudiano e @blogmochilando.
Um cheiro. Light Blue.
Uma pessoa. Minha mãe.
Uma palavra. Amor.


⇢  Para ver mais fotos de Maria Laura clique aqui e acesse o meu Flickr.


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