A cura no fundo do mar

Cursando o terceiro ano de Medicina, Phercyles também é vinculada à várias pesquisas da UFRJ (FOTO: Gabriela Isaias)
Phercyles vem de Pérside, uma mulher cristã cheia de fé citada em uma das cartas de Paulo, na Bíblia. Pérside vem do grego Persida, que pode significar “aquela que veio da Pérsia” ou perseverança e dedicação. E não é difícil perceber que entre o par de olhos verde água de Phercyles Veiga há a inteligência e concentração que lhe renderam inúmeros diplomas na área biológica. São dois pós-doutorados, além do mestrado, doutorado e a segunda graduação a caminho. É que depois de se formar e especializar em Farmácia, a garota de Campo Mourão decidiu realizar um sonho antigo: fazer Medicina.

Morando no Rio de Janeiro há sete anos, Phercyles mantém a voz doce e a vontade de aprender coisas novas que lhe levou à equitação, natação e aulas de piano. Apaixonada por pesquisas na área da saúde, ela já foi à Grécia estudar algas locais para tratar a doença de Chagas e hoje atua como pesquisadora em diversas frentes biológicas. Calma, discreta e com riso fácil, Pher (como é chamada pelos amigos) compartilhou um pouquinho da sua história nesta entrevista.


Aquela Garota da Foto: Você tem vários diplomas, todos eles ligados à área da saúde. Quando você percebeu que queria seguir essa parte da biologia?
Phercyles: Desde que me conheço por gente quero ser da área da saúde! Já consultava minhas bonecas com 5 ou 6 anos. [Risos] Só que quando terminei o Ensino Médio, minha família se encontrava com muitos problemas pessoais e financeiros. Então resolvi fazer Farmácia pra ocupar meu tempo. Mas nunca cogitei trabalhar como farmacêutica. Foi no fim do curso me apaixonei pela pesquisa. 

AGF: E o que te levou a fazer Medicina mesmo já sendo formada em Farmácia?
P: A Medicina só veio agora porque decidi abrir meu campo de trabalho, expandir a pesquisa para a clínica médica, e também satisfazer um sonho antigo.

Nascida e criada em Campo Mourão, no interior do Paraná, Phercyles mora no Rio há sete anos (FOTO: Gabriela Isaias)
AGF: Você fez mestrado em farmacologia, doutorado em Bio-Física e dois pós-doutorados de pesquisas de remédios. Conhecendo as indústrias farmacêuticas, o que você pensa sobre os altos preços cobrados em remédios vitais?
P: Eu não tenho críticas às empresas que trabalham no ramo farmacêutico. As que eu conheci são muito sérias, organizadas, empregam uma mão de obra extremamente qualificada e investem milhões em pesquisas, desenvolvimento tecnológico e saúde. Mas tenho críticas quanto aos sistemas de governo que não sabem gerir as necessidades de saúde do povo, permitindo a biopirataria, não investindo em pesquisa e educação ou criando centros de desenvolvimento tecnológico. Por isso eles [sistemas de governo] se tornam dependentes das empresas privadas estrangeiras. Então se as empresas cobram algum preço abusivo por medicamentos vitais, os culpados são exclusivamente o sistema de gerência da pesquisa, a falta de investimento e negociação e a pouca tecnologia disponível, entre outros.

Divertida, ela confessa que ama funk e "sofrência" sertaneja (FOTOS: Gabriela Isaias)
AGF: Você comentou que já foi à Grécia.
P: Sim, eu fui! Foi mágico, um período de muito conhecimento. Foi a primeira vez que eu viajei pra fora do país, fiquei encantada com o mundo. Durante os quatro meses que fiquei lá eu estudava e nos fins de semana passeava. Até cheguei a ir em outros lugares da Europa como França e Alemanha, mas sempre com pouco dinheiro, era tudo contadinho, sabe? Ai, que saudade daquela época!

“Fui à Grécia conhecer como eram feitas as coletas e extrações de algas para o tratamento de doenças”

AGF: E por que você escolheu a Grécia para estudar?
P: Porque meu orientador me propôs. Eu testava drogas para a doença de Chagas [Phercyles fez dois pós-doutorados nos quais pesquisou drogas para tratar a doença de Chagas] que vinham de uma alga grega. Por isso ele propôs que eu fosse lá conhecer como eram feitas coletas e extrações dessas algas para o tratamento de doenças.

Centrada, a paranaense diz sempre tentar ver o outro lado dos acontecimentos (FOTOS: Gabriela Isaias)
AGF: E quando você decidiu vir para o Rio de Janeiro?
P: Eu decidi vir para o Rio porque queria estudar em um centro de referência na área de Biofísica, então fiz prova para o doutorado na UFRJ, passei e vim.

AGF: Você nasceu e morou em Campo Mourão, no interior do Paraná. Como foi o processo de adaptação ao Rio de Janeiro? 
P: A adaptação foi tranquila porque de cara já amei o Rio! Aqui é tudo mais leve, o clima é mais feliz. Sou apaixonada por esse lugar!

Ela começou a tocar piano por influência da mãe, que sempre tocou o instrumento (FOTO: Gabriela Isaias)
AGF: O que você mais gosta e o que menos gosta na sua profissão?
P: Como pesquisadora e futura médica, eu gosto do desafio do diagnóstico, a investigação para encontrar o melhor tratamento. O ponto negativo é a dificuldade de se pesquisar e estudar em um país com recursos tão escassos para a educação, saúde e tecnologia.

“Preguiça não existe na minha rotina”

AGF: E o quanto sua relação com a Farmácia/Medicina mexeu com a sua personalidade?
P: Acredito que os estudos nessa área me deixaram muito mais séria, organizada e comprometida. Eu não sei ser irresponsável, "deixar pra lá". Preguiça não existe na minha rotina.

Quando foi à Grécia, Phercyles aproveitou para conhecer França e Alemanha (FOTO: Gabriela Isaias)
 AGF: Agora mudando radicalmente de assunto, me diz uma lembrança gostosa que você tem da sua infância!
P: Eu me lembro de jantar cachorro quente no quiosque de um amigo do meu pai (nunca comi um lanche melhor que aquele!) e de fazer natação no estádio da cidade.

AGF: Ah! Você fez natação?
P: Sim! Era um ambiente super descontraído, o momento em que eu mais me divertia. Meus momentos de alegria estavam na escola, na natação e na equitação.

AGF: Então você fez equitação?
P: Sim, eu amava ficar o dia todo com os cavalos, era uma cowgirl! [Risos] Andava de chapéu e tudo! Com uns 16 anos eu até competia! Tinha um cavalo chamado Belmonte. Ai, ele era lindo! É engraçado porque eles pegam amor à gente que começa a montar, principalmente com crianças. Então quando eu chegava ele começava a relinchar dentro da baia que ele ficava, acho que porque sentia meu cheiro de longe. Enquanto eu não ia lá falar com ele, ele não parava, ficava super elétrico! Comigo ele era todo delicado, ia devagar, ficava quietinho e dava uns passos super lentos. Mas eu me lembro que quando o meu treinador montava no Belmonte, ele ficava super agitado, bravo, enquanto comigo era super manso.

Ela começou a praticar equitação com 13 anos e só parou aos 17, quando entrou na faculdade (FOTOS: Gabriela Isaias)
AGF: Você começou a montar com quantos anos?
P: Comecei a montar nele com 13 anos e parei com 17, quando comecei a prestar vestibular e fazer faculdade, então acabei deixando a equitação de lado. 

“Acho esse mundo de cowboys, pelo menos do jeito que eu conheci, muito saudável para crianças”

AGF: Sim, mas voltando um pouco: como assim você era cowgirl?
P: [Risos] Eu andava de chapéu, bota, aqueles cintões… Até porque era a roupa que a gente tinha que usar durante as competições e depois eu comecei a gostar, então andava direto daquele jeito! [Risos] Era muito gostoso. E eu acho esse mundo de cowboys, pelo menos do jeito que eu conheci, muito saudável para crianças porque evita que elas estejam na rua fazendo qualquer maldade. Você fica lá ensinando os animais, sempre com bons tratos. É muito proveitoso. 

Filha única e com uma família pequena, a pisciana conta que não assistia televisão na infância (FOTO: Gabriela Isaias)
AGF: Se amanhã você pudesse acordar desfrutando de uma nova habilidade, qual escolheria??
P: Gostaria de ser mais criativa e artística!

AGF: Mas você já não toca piano? 
P: Eu sempre gostei de aprender coisas novas, né? Então eu montava, nadava, tocava piano... Eu sou formada em piano, adoro tocar e tenho vontade de voltar a fazer. A única coisa que eu nunca fiz, não sei se por não ter dom ou por não ter sido estimulada, é dança e pintura, arte, filme, tv. Eu tinha uma vida muito cheia de cobranças, então não assistia televisão, ficava por fora de filmes, apresentações, peças de teatro, músicas. Minha infância era basicamente relacionada a estudos, livros e aprendi a gostar disso. 

Após a graduação em Farmácia e as inúmeras especializações, ela agora quer se formar em Medicina (FOTO: Gabriela Isaias)
AGF: Quais são seus próximos projetos? 
P: Quero terminar a medicina e passar em uma boa residência, me estabilizar em um local e criar raízes.. 

AGF: Agora imagine que você vai ler essa entrevista daqui a 10 anos. Que recado você daria a você mesma no futuro?
P: “Não trabalhe e nem estude tanto: também há vida lá fora para ser vivida”.


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LIGEIRINHAS

O que te tira o sono? Muitas coisas! Perco o sono com facilidade.
Um medo. De barata!
Uma frustração. Não ter feito Medicina antes.
Um lugar. Paris.
Farmácia ou Medicina? Medicina.
Rio ou Paraná? Rio.
Uma música. Quando o DJ Mandar, do Dennis DJ.
Uma saudade. Do Belmonte ❤
Foi golpe ou não foi golpe? Não foi golpe.
Manda nudes? Não! 
Três lugares favoritos: Praia, meu quarto e uma boa cafeteria.
Um cheiro. Chuva.
Uma pessoa. Minha mãe.
Uma palavra. Resiliência.



⇢ Para ver mais fotos de Phercyles clique aqui e acesse o meu Flickr.



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